Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá promove evento sobre diversidade

Série de seminários está percorrendo o país trazendo discussões sobre inclusão e diversidade para dentro do órgão, que em breve receberá os primeiros integrantes trans aprovados em concurso

Apresentação de Zélia Amador de Deus, Marcia Passos, Vicky Cordeiro e Jéssica Barreto durante a abertura dos relatos.
Apresentação de Zélia Amador de Deus, Marcia Passos, Vicky Cordeiro e Jéssica Barreto durante a abertura dos relatos.

O Ministério Público do Trabalho no Pará e Amapá (MPT PA-AP) realizou ao longo da última segunda-feira (12) o evento “Perspectivas de gênero, raça e diversidade e suas interseccionalidades - diálogo e conscientização”. A série de seminários é promovida nacionalmente dentro dos eixos de equidade de gênero, violência contra a mulher e assédio moral, com o objetivo de estimular o entendimento sobre diversidade e inclusão dentro do MPT e da sociedade. Em breve, o órgão deverá implementar a cota para pessoas trans nos próximos concursos da instituição.

Participaram do encontro do dia 12 o procurador-chefe do MPT PA-AP, Sandoval Silva; a vice-procuradora-geral do Trabalho, Maria Aparecida Gugel; e a subprocuradora-geral do Trabalho, Eliane Araque dos Santos. A programação incluiu uma mesa de depoimentos de ativistas pela diversidade e inclusão composta pelos professores da Universidade Federal do Pará (UFPA) Zélia Amador de Deus e Almires Martins Machado; pela advogada e pesquisadora sobre direito das pessoas com deficiência Jéssica Ribeiro Barreto; pela psicologue clínique Vicky Cordeiro, pessoa trans não-binárie; e pela coordenadora geral do LESBIPARA Márcia Passos. Além disso, também houve a palestra “Perspectivas sobre igualdade de gênero no Direito”, ministrada pela pesquisadora Clarice Santos, mestra e doutoranda em direito pela UFPA. À tarde, foi realizada uma roda de conversa com servidores, procuradores e estagiários da instituição.

Sandoval Silva, procurador-chefe do MPT PA-AP, no púlpito durante a abertura do evento.
Sandoval Silva, procurador-chefe do MPT PA-AP, no púlpito durante a abertura do evento.

Durante a abertura do evento, o procurador Sandoval Silva disse estar feliz com a realização de uma programação que tem o intuito de entender e diminuir desigualdades no ambiente de trabalho e na sociedade. “Esse tipo de evento nos mostra as distinções que fazemos dentro de uma cultura violenta, demonstrando que essa violência deve ser combatida, não com outro tipo de violência, mas com sensatez, integração, interdependência e empatia”, ressaltou ele. Já durante a palestra com o tema “Equidade de gênero, raça e diversidade com a ótica da inclusão”, a vice-procuradora-geral Maria Aparecida Gugel pontuou que esse tipo de iniciativa integra uma das obrigações do MPT, no que diz respeito a certificar que servidor, terceirizado e estagiário tenham a percepção clara de que estão em um ambiente acolhedor e inclusivo. 

Maria Aparecida Gugel, vice-procuradora-geral do Trabalho, durante o evento.
Maria Aparecida Gugel, vice-procuradora-geral do Trabalho, durante o evento.

Eliane Araque dos Santos, subprocuradora-geral do Trabalho, durante o evento.
Eliane Araque dos Santos, subprocuradora-geral do Trabalho, durante o evento.

Uma das iniciativas para entender o cenário dentro do MPT, por exemplo, foi a criação do censo interno de Gênero, Raça e Diversidade, que mapeou a diversidade institucional, a fim de auxiliar na formulação de políticas de inclusão. “Não basta elaborar uma norma e achar que está tudo certo. É preciso trabalhar com ela, e fazer com que cada pessoa reflita seu próprio comportamento diante de uma determinada situação”, disse Maria Aparecida. Na mesma linha, a subprocuradora-geral Eliane Santos, que palestrou sobre assédio moral dentro do serviço público, ponderou que “mais do que punição, as pessoas buscam ser reconhecidas nas suas diversidades e respeitadas em suas individualidades. Esse tipo de política não fala em repressão, mas sobre buscar soluções pacificadoras”.

Já a pesquisadora Clarice Santos trouxe a discussão acerca da atuação feminina dentro da área jurídica, reformas legislativas e posicionamentos jurisprudenciais voltados a mulheres. “A metodologia interseccional, que é título do evento e orienta minha abordagem, permite reconhecer que existe o entrelaçamento dos sistemas de opressão”, explicou a advogada.

Ativistas pela inclusão

Zélia Amador de Deus, Marcia Passos, Vicky Cordeiro e Jéssica Barreto durante os relatos de ativistas.
Zélia Amador de Deus, Marcia Passos, Vicky Cordeiro e Jéssica Barreto durante os relatos de ativistas.

A manhã foi encerrada com os depoimentos de ativistas pela inclusão. Sobre as violências sofridas pelas pessoas com deficiência na sociedade, Jéssica Barreto frisou que outros marcadores sociais se juntam ao capacitismo. “Existe a infantilização das mulheres com deficiência, refletida quando chegam à fase adulta”. Ela relatou que há médicos que inclusive prescrevem a esterilização dessas mulheres a partir do uso de anticoncepcionais, apesar da Lei Brasileira de Inclusão prever que a deficiência não afeta a capacidade individual de saúde sexual ou reprodutiva da pessoa.

Ainda durante a mesa, Marcia Passos e Vicky Cordeiro, representantes das causas LGBTQIA+, pontuaram as dificuldades de empregabilidade e violências contínuas, recorrentes no meio ambiente de trabalho, contra pessoas que não são heterossexuais ou cisgênero. Marcia Passos relatou a situação de vulnerabilidade que muitas mulheres lésbicas e bissexuais assumidas encontram dentro do mercado de trabalho formal por conta do preconceito e ressaltou que “trabalhar visibilidade é trabalhar saúde, geração de renda, emprego e nossa vida”. Vicky Cordeiro complementou dizendo que a transfobia, somada à falta de apoio familiar e evasão escolar, também resulta em situações de violência dentro do mercado de trabalho. “Quando olhamos uma cultura organizacional que não foi preparada para pessoas trans, é constante o assédio sexual e moral. Muitas pessoas permanecem neste tipo de emprego porque foi a única oportunidade que acharam, ou porque acreditam que não conseguiriam achar algo melhor”.

Clarice Santos ministrando a palestra "Perspectivas sobre igualdade de gênero no direito".
Clarice Santos ministrando a palestra "Perspectivas sobre igualdade de gênero no direito".

Almires Martins Machado, professor do Programa de Pós-graduação em Direito da UFPA e primeiro professor indígena admitido na instituição por concurso, trouxe o relato de como o apagamento de falas indígenas resulta diretamente na negação de direitos, salientando a importância de momentos em que se ouça a vivência de representantes e lideranças. “Quando trazemos a público os problemas que enfrentamos e vivemos, somos alvos de racismo estrutural e institucional. Levam mais em consideração pessoas que passaram um, dois meses na aldeia que a nossa própria voz. Nós que nascemos, crescemos e vivemos”. O professor reforçou a importância de se abrir espaços de diálogo para alcançar mudanças, e comparou a garantia de direitos para trabalhadores indígenas hoje à década de 1990.

Para encerrar a mesa, Zélia Amador de Deus, referência na pesquisa e militância do movimento negro no Pará, trouxe a reflexão sobre como o conceito de diversidade é entendido. Segundo Zélia, quando a sociedade estabelece um padrão do que é “normal”, tudo que não se enquadra é excluído, com espaços voltados para uma suposta normatividade. “Temos que discutir como entendemos a diversidade. Ela não é composta pelas vítimas de opressão que essa sociedade construiu. A diversidade é uma riqueza da humanidade”, finalizou a professora.

Ministério Público do Trabalho

Assessoria de Comunicação

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